Trópico de Capricórnio

É a linha geográfica imaginária situada abaixo do Equador. Fica localizada a 23º 26' 27'' de Latitude Sul. Atravessa três continentes, onze países e três grandes oceanos.


quarta-feira, 28 de dezembro de 2011

Uma noite p´ra esquecer



Há muito que estava tudo muito bem combinado. Paulo e Cristina, Marta e Pedro. Sairiam de casa, lá por volta das dez, para não perderem um minuto, até calhava bem porque moravam perto uns dos outros, ali para os Olivais, numa urbanização bem bacana. Os pais eram gente boa, porreiros e até deram uma ajuda; eram ainda novos, na casa dos quarenta, lisboetas boa pinta. O pai da Marta usava brinquinho na orelha. A mãe da Cristina tinha dois "piercings" e era toda jeitosa. Conheciam-se todos e sabiam bem como era bom passar um fim de ano em grande. O pai do Pedro, um empresário designer enfiou-lhe uma nota de 50 euros, no bolso da calça, mesmo assim: vá lá pá, diverte-te e embute! A mãe da Cristina, organizadora de eventos, essa então foi bem mais generosa, andava a guardar umas notas para fazer uma surpresa à filha: - Vem cá, filha, guardei para ti. Foram logo cem euros duma assentada. O Becas, como era conhecido o pai do Paulo, era um empresário com vários negócios. Não tinha ramo fixo, mas estava sempre ativo e a fazer dinheiro em várias coisas ao mesmo tempo. Um vivaço à boa maneira. Só se queixava dos impostos. Isso é que era o grande mal deste país dizia ele. Mas cada vez engordava mais a sua conta bancária.

 Tudo corria pelo melhor. Bem vestidos, calças acabadinhas de estriar, gravatinhas à maneira, uma maravilha todos eles. Não chovia nem estava muito frio. Os rapazes banhados em Paco Rabane, elas molhadas em Tommy Hilfiger. Jantaram uns camarões e massas italianas, num pequeno restaurante novo, com luzes baixas, - uma intimidade que só visto, uma coisa mesmo especial! - que abrira a caminho da discoteca. Ali estiveram a aquecer. Beberam algumas cervejas, eles, só duas cada um. A Cristina foi para os martinis, foram logo três seguidos para aperitivo; depois foi o vinho branco colheita especial, para todos. Marta só entrou nas rodadas na hora do verdinho.

 Lá para a meia noite partiram para as Docas, no carrinho do Pedro, um Honda azul metalizado, todo bem quitadinho, a esgalhar. Entraram e começaram a abrir com "shots". Dançaram e a noite prometia. Passaram a meia-noite e foram abraços e beijos que nunca mais acabavam. Chamadas telefónicas nos wcs para os pais, sms para os amigos. Tudo na maior das curtições.

 Mas de repente há um tipo que se mete com a Marta e Pedro pergunta-lhe se tinha algum problema.
- Ó meu, estás cansado de estar bem? Diverte-te, pá! O outro, um tipo das Galinheiras, entroncado e bem musculado, não gostou do ar de menino bem do Pedro e pergunta-lhe se quer experimentar lá fora…Diz-lhe que a miúda devia era estar do lado dele. O Pedro não engoliu a afronta, porque também não era tanso, era menino, mas sabia bem o que era a vida.

 Saíram aos empurrões, já nada nem ninguém os segurou. O Pedro lançou-se ao tipo, atirou-lhe logo um direto aos queixos. Exacerbados pelo etílico, gritavam e rasgavam-se engalfinhados. O tipo das galinheiras, era mesmo do piorio, gangster, meteu a mão atrás das costas, sacou uma fusca e disparou sobre o Pedro. Apanhou-lhe em cheio no peito, fazendo saltar para fora da camisa uma roseta vermelha, de sangue quente que não mais parou de se espalhar. Tudo se transformou. Marta e Cristina desatam aos gritos, descontroladas, choram, o tipo foge para o carro e arranca a toda a velocidade. Chamam o 112, aparece a polícia e isola o local. Pedro está muito mal, sacode o corpo, agarrado ao peito. Os amigos acarinham-no, Paulo, agarra-se ao amigo. Os três estão em volta dele. Aparace o 112 e leva o Pedro que se apaga a meio do caminho. Quando chegam ao hospital fazem tudo para trazê-lo à vida mas já nada é possível.
Aos vinte e sete anos, uma bala desnecessária cruzou-se no caminho de Pedro.

 Pedro é agora apenas uma doce recordação para os amigos. Marta está solitária há três anos. Perdeu a vontade de tudo. Diz a todos que Pedro era único e nunca voltará a ter mais ninguém. Sofre do coração e já teve um princípio de enfarte. Consome-se em recordações. Teve um esgotamento cerebral e nunca mais pôs os pés numa discoteca.

 J.L.F.




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